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A história do Fiat Coupé, ou a arte da criatividade

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O Fiat Coupé (codinome interno 175) teve vida curta -foi produzido de 1993 a 2000- mas é um dos modelos mais icônicos da marca italiana e uma verdadeira referência no desenho automotivo dos anos 1990. Com seu estilo incomum e desempenho de bom nível, este cupê esportivo conquistou admiradores em todo o mundo, inclusive aqui no Brasil. Hoje, ele continua sendo procurado por quem valoriza originalidade das formas, emoção ao dirigir e condução envolvente.

por Ricardo Caruso

Flagrado em testes em 1992, apresentado no Salão de Bolonha em 1993 e lançado oficialmente em 1994, o Fiat Coupé nasceu com a missão de oferecer no mercado um carro esportivo acessíve e com uma identidade única. O desenho exterior, assinado por Chris Bangle, destacou-se pelas linhas agressivas e pelos recortes característicos nos para-lamas, detalhe visual único e realmente ousado e marcante.

O interior foi projetado pela Pininfarina, que deu ao Fiat um toque de exclusividade, ao incluir elementos na cor da carroceria no painel, criando uma atmosfera moderna e esportiva.

Desde o início, o Fiat Coupé apresentou diversos motores focados em desempenho. A versão inicial, o 2.0 16v Turbo, com 190 cv de potência, acelerava de zero a 100 km/h em menos de 7 segundos. Em 1996, chegou a versão mais potente e emblemática: o 2.0 20V Turbo, de cinco cilindros, com 220 cv e tração dianteira, usada aqui no Brasil no Marea. Com velocidade máxima superior a 240 km/h, esta versão foi um dos carros de tração dianteira mais rápidos da década, rivalizando com modelos de segmentos superiores.

Entre 1993 e 2000, foram produzidas cerca de 72.000 unidades, todas montadas pela Pininfarina em Turim, na Itália . Ao longo do tempo, o modelo recebeu atualizações e edições especiais que ainda hoje são muito valorizadas.

  • 2.0 16V e 16V Turbo – As primeiras versões com motor de quatro cilindros;
  • 1.8 16V – Opção mais acessível, lançada posteriormente;
  • 2.0 20V e 20V Turbo – Com cinco cilindros e um som de escapamento envolvente;
  • Coupé Plus – Inclui melhorias técnicas, freios Brembo e detalhes exclusivos;
  • Edição Limitada (LE) – Versão numerada com bancos Recaro, volante esportivo e acabamentos exclusivos de fábrica.

Mas sua história não é tão simples assim. Os italianos -ou qualquer outro interessado no assunto- sempre desejaram ter na garagem uma Ferrari, Lamborghini ou Maserati, mas como estas marcas estão distantes dos pobres mortais, restava sonhar com carros mais baratos e possiveis. A Fiat, na época mais interessada em produzir carros populares, tem em sua história carros esportivos memoráveis, como o 8V, o Dino e o X 1/9 de motor central-traseiro, reproduzido no Brasil como “Dardo”, além de pequenos cupês, como os das linhas 850, 124 e 128. E, mais recente, o Barchetta do final ds anos 1990.

A fórmula aplicada no Coupé foi a mesma de outros esportivos: usar a plataforma de um modelo de grande produção, no caso o Tipo lançado em 1988. Foi assim com o VW SP2 no Brasil em 1972, com o Ford Capri (1968), Opel Manta (1970), Opel Calibra (1989), Renault Fuego (1980) e VW Scirocco (1974) e VW Corrado (1988), entre muitos outros.

O desenho foi criado, como já vimos antes, pelo estadunidense Chris Bangle, meio desconhecido naqueles tempos e que em seu currículo traz erros e acertos. A década de 1990 foi um momento crucial para a Fiat: com Paolo Cantarella no comando da empresa, os ventos da criatividade e boa dose de ousadia sopraram forte em Turim. O engenheiro piemontês impulsionou a empresa a diferenciar ainda mais sua produção e, para isso, concentrou-se no Centro de Estilo da Fiat, liderado pelo arquiteto Ermanno Cressoni, que já havia sido chefe de desenho da Alfa Romeo antes de chegar a Turim. O resultado foi uma equipe capaz de oferecer todos os tipos de carros: de sedãs tradicionais a vans originais, mas também brilhantes cupês esportivos e spiders.

A grande equipe liderada por Ermanno Cressoni combinava o espírito inovador dos americanos Chris Bangle e Mike Robinson com a criatividade do grego Andreas Zapatinas, além de um time de jovens e talentosos italianos.

As ideias individuais dos membros da equipe eram valorizadas, mas o resultado final era sempre fruto do trabalho conjunto de uma equipe unida. A criatividade resultante era certamente inovadora, por vezes até mesmo pouco convencional, mas sempre extremamente prática e funcional: as escolhas feitas não tinham apenas um propósito estético, mas surgiam da necessidade de aprimorar a ergonomia e a eficiência geral do carro. Logo, os primeiros computadores chegaram para auxiliar nos trabalhos, mas etapas como modelagem tradicional ainda eram comuns, usando massa de modelar ou construindo modelos em escala 1:1 à mão com gesso.

Duas ideias de Bangle para o Fiat Coupe. Na imagem acima, duas opções para a traseira.

Foi nesse contexto que o grupo liderado por Chris Bangle e supervisionado por Ermanno Cressoni criou o Fiat Coupé.

O carro foi apresentado no Salão de Bruxelas de 1993 e colocado à venda em fevereiro de 1994. Chamava atenção, pela frente limpa e baixa, com faróis duplos coberturas onduladas de policarbonato, nove ranhuras para entrada de ar abaixo da grade principal, o enorme capô que se unia aos para-lamas e os recortes dos para-lamas. As linhas eram completamente novas, e a solução do capô que se estendia até o para-lama levou à criação do termo italiano “cofango”, uma junção “cofano” (capô) e “parafango” (para-lama).

Também vinha sem maiores vincos nas laterais, o que destacava ainda mais os recortes dos para-lamas; as maçanetas eram embutidas nas colunas, e a tampa traseira era bem curta, com quatro lanternas circulares (duas de cada lado), claramente inspiradas nas Ferrari. A tampa de gasolina era metálica, exposta e com trava de segurança de liberação rápida, algo conhecido em modelos de competição antigos.

Apesar de manter a distância entre-eixos do Tipo (2,54 metros), o Coupé era 29 cm mais longo (4,25 m), 7 cm mais largo (1,77 m) e 9 cm mais baixo (1,34 m), o que garantia boas proporções no desenho. Foi construído sobre a plataforma “Tipo 2”, que já havia demonstrado sua versatilidade no segmento C com o Fiat Tipo e o Tempra, e também como com o Lancia Dedra e os Alfa Romeo 145 e 155. O coeficiente de penetração aerodinâmica (Cx) era de 0,31.

Outro dos destaques do carro era o interior, assinado pelo estúdio Pininfarina, que muitos pensam ser também o autor da carroceria por conta dos emblemas da empresa aplicados do lado externo; a Fiat até encomendou uma proposta de estilo do estúdio italiano, mas acabou declinando. Com uma faixa na cor do carro que se estendia pelo painel e unia as portas -alojando os instrumentos- o ambiente parecia ser exclusivo, apesar de exibir algumas peças do Tipo e de outros carros da marca. A capacidade do porta-malas era adequada para um pequeno esportivo, com 295 litros.

No lançamento, o Fiat Coupé estava disponível com dois motores de 2,0 litros, quatro cilindros e quatro válvulas por cilindro: o aspirado, com potência máxima de 142 cv e torque máximo de 19 mkgf, e o turbo com 195 cv e 29,6 mkgf, basicamente o mesno aplicado na memorável Lancia Delta Integrale; ambos tinham eixo de balanceamento. O câmbio era manual de cinco marchas e a tração dianteira. Com o motor turbo, acelerava de zero a 100 km/h em 7,5 segundos e alcançava a velocidade máxima de 225 km/h (era o Fiat mais rápido até então), enquanto o aspirado chegava aos 208 km/h, segundo números da fábrica.

Para lidar com a potência mais elevada, a versão Turbo era equipada com diferencial autoblocante Viscodrive, solução rara naqueles tempos. Viscodrive refere-se a um sistema de embreagem viscosa (ou acoplamento viscoso) que transfiere torque entre os eixos de um veículo, proporcionando tração sob demanda. Ele funciona com base no atrito de placas dentro de um fluido de silicone, transferindo mais força para o eixo com melhor aderência quando uma perda de tração ocorre, sem a necessidade de eletrônica. As suspensões independentes, vindas do Tipo, eram tipo McPherson na frente e com braços arrastados na traseira. Os freios eram a disco nas quatro rodas com ABS de série.

A “Last Edition” de 2000

Havia dois níveis de acabamentos, Comfort e Plus, o primeiro com rodas de 15 polegadas (pneus 195/55) e o segundo com rodas de 16 polegadas (pneus 205/50), estofamento em couro e ar-condicionado. O peso do Coupe Comfort, o mais leve, era de 1.250 kg.

No Salão do Automóvel de Turim, na primavera de 1996, a linha foi renovada para 1997, mas apenas mecanicamente: o motor de quatro cilindros e 2,0 litros foi substituído pelo de cinco cilindros e 20 válvulas, tanto na versão aspirada (o mesmo do Marea brasileiro) quanto na turbo. O sofisticado motor “Pratola Serra” –assim batizado em homenagem ao município onde a fábrica estava localizada– era equipado com eixo balanceador, comando de ignição variável e ignição de bobina única. A versão de maior desempenho (turbo) atingia 220 cv e a velocidade máxima declarada era de 250 km/h; acelerava de zero a 100 km/h em 6,5 segundos. Foi vendida ainda uma versão com o motor do Barchetta, 1,8 litros, 131 cv e 16,7 mkgf, que equipou o Brava HGT e Marea aqui no Brasil. Nesta evolução, o interior ganhou um novo console e outro sistema de áudio.

Mais um ano, e em 1988 o 2,0 aspirado foi recalibrado e passou para 154 cv, graças à adoção de coletor de admissão variável. A série “Limited Edition” foi disponibilizada em 1989, com bancos Recaro revestidos de couro, caixa de câmbio manual de seis marchas, freios Brembo mais eficientes, botão de partida e um kit aerodinâmico. Fazia de zero a 100 em 6,3 s. Alguns desses itens foram usados depois no carro de linha e uma série final, “Last Edition”, foi feita em 2000.

O Fiat Coupé foi vendido no Brasil em 1995 na versão 2,0 aspirada, que usava o motor do Tipo 16V vendido aqui, com 137 cv. Chamava muita atenção nas ruas e poucos sabiam que usava a mesma plataforma do Tipo. Teve vida curta aqui e deixou de ser oferecido dois anos depois, com 980 unidades vendidas. Poucas unidades turbo foram trazidas pela própria Fiat, para uso interno e avaliações.

No total, foram fabricados 72 mil Coupé até 2000. O simpático Fiat ofereceu ao mercado, não apenas italiano, um carro esportivo com linhas originais que chamavam a atenção e proporcionavam um desempenho emocionante, além de ser um produto excepcionalmente institucional para a marca. Afinal, a Fiat fazia o Uno, mas também fazia um belo esportivo. Fácil de dirigir e equipado com mecânica cada vez mais refinada para a época, ele personificou por alguns anos a interpretação da Fiat sobre o conceito de esportividade.

AnoUnidades produzidas
1993119
199417.619
199513.732
199611.273
199712.288
19989.042
19996.332
20002.357
Total72.762

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