WLTP? NEDC? EPA? CLTC? Como é medida a autonomia dos carros elétricos
Os dados sobre consumo de combustível desempenham um papel importante para os compradores na hora de escolher um carro novo. Afinal, consumo menor significa que o carro é mais econômico e produz menos emissões de poluentes. Mas só isso não explica claramente a distância que você pode percorrer entre os reabastecimentos. Para quem vai comprar um carro elétrico, o oposto é verdadeiro: a autonomia é a distância que o veículo consegue percorrer com a bateria totalmente carregada. Então, como se chega a esses números?
por Ricardo Caruso

Quando um fabricante promete 600 ou 700 km de autonomia, a realidade costuma ser mais modesta. O motivo está nos ciclos de teste: NEDC, WLTP, CLTC ou EPA avaliam o mesmo carro de formas diferentes e entregam números também diferentes. E a autonomia é o fantasma que ainda assombra muitos usuários de carros elétricos.
O mais otimista é o veterano NEDC, criado nos anos 1970. As suas estimativas ficam 20% a 30% acima do uso real porque o ensaio evita ar-condicionado e parte de acelerações suaves. Já o WLTP europeu chega mais perto do que se consegue no dia a dia. Considera velocidades mais altas e o uso de faróis e climatização, por isso a autonomia WLTP fica de 15% a 25% menor, e por outro lado, soa muito mais honesta.
O parâmetro mais rigoroso é o ciclo norte-americano EPA (Environmental Protection Agency, Agência de Proteção Ambiental): os carros passam por diferentes temperaturas e cenários de condução, e os resultados costumam ficar 10% a 20% abaixo do WLTP. O CLTC (China Light-Duty Vehicle Test Cycle) chinês, por sua vez, privilegia trechos urbanos de para e anda e tende a inflar a autonomia em cerca de 15% a 30%. Na prática, essas diferenças explicam por que a mesma ficha técnica pode inspirar expectativas tão distintas.
Como exemplo dessa variação, temos os números de autonomia do Tesla Model 3: são 675 km pelo CLTC, 602 km pelo WLTP e 576 km pelo EPA, vartiação de quase 100 km, o que não é pouco. Assim, no uso cotidiano, os números WLTP são os que menos tendem a surpreender o motorista, o que ajuda a planejar melhor trajetos e viagens.

Por isso, o mais usado no mundo hoje é o WLTP (Worldwide Harmonised Light Vehicles Test Procedure, ou Procedimento de Teste Global Harmonizado para Veículos Leves), que substituiu o teste NEDC (New European Driving Cycle, ou Novo Ciclo de Condução Europeu) quando foi introduzido em 2018 e foi projetado para simular melhor as condições reais de condução. É aplicados às medições em qualquer tipo de veículo, e no caso dos elétricos, traz números mais confiáveis do que o NDEC ou CLTC, que são mais generosos.
Para veículos elétricos, este cálculo considera a autonomia do veículo (exibida em km) e o consumo de energia (medido em quilowatts-hora/100 km) com uma variação específica do programa de testes em comparação com veículos com motor de combustão interna.
Em todos os casos –independente do tipo de motor que o veículo utiliza– a maior parte do programa de testes WLTP é realizada em dinamômetro em laboratório, e as montadoras são obrigadas a fornecer uma frota de veículos (incluindo exemplares com as especificações mais leves e mais pesadas) para garantir resultados consistentes.
O ambiente do laboratório é aquecido a 23 graus Celsius –considerada a temperatura ideal para o funcionamento das baterias– e cada carro é submetido a um teste de condução pré-programado em dinamômetro de rolos, sem o uso de quaisquer funções auxiliares, como ar-condicionado, sistemas de áudio e faróis.
Cada veículo é submetido a dois testes dinâmicos no Ciclo de Teste Global Harmonizado para Veículos Leves (WLTC), que é dividido em quatro subseções projetadas para simular condições de condução urbana e em rodovias. Os parâmetros WLTC variam dependendo da relação peso/potência, com os veículos divididos em três categorias: menos de 22 W/kg, 22-34 W/kg e aqueles com mais de 34 W/kg. Cada percurso de teste WLTC tem duração de 30 minutos e cobre um total de 23,25 km à velocidade média de 46,5 km/h.
A primeira fase de baixa velocidade tem duração de 3095 metros rodados e 9m.53s, com o carro viajando a uma velocidade máxima de 56,5 km/h e velocidade média de 18,9 km/h, permanecendo parado por 26,5% do tempo. Isso foi projetado para simular condições urbanas intensas, com inúmeros cruzamentos e semáforos.
A segunda fase intermediária tem duração de 4756 metros e 7m.13s, aumenta a velocidade máxima para 76,6 km/h e a velocidade média para 39,4 km/h, e reduz o tempo de parada para 11,1%. Os resultados combinados dos dois primeiros segmentos são usados para calcular o consumo do veículo no ciclo urbano.
A terceira fase, de alta velocidade, tem 7065 metros e duração de 7m.35s, incluindo um trecho de condução a 97,4 km/h com média de 56,5 km/h, e o carro fica parado apenas no início e no final da fase, totalizando 6,8% de duração.
Na fase final “Extreme High”, que dura apenas 5m. 23s, o carro percorre 8.254 metros e passa a maior parte do tempo acima de 100 km/h (até o máximo de 131 km/h, com média de 91,7 km/h), e apenas 2,2% do tempo parado. A combinação da terceira e da quarta fases é usada para determinar os valores de consumo de energia do Ciclo Extraurbano.

Exclusivamente para veículos elétricos, cada segmento dinâmico inclui um ciclo WLTC completo mais a primeira fase de baixa velocidade (totalizando 31,113 km), seguida por um trecho de velocidade constante a 100 km/h. Isso ocorre porque um carro elétrico inicia o primeiro percurso com a bateria totalmente carregada, o que limita os benefícios da frenagem regenerativa no início do ciclo.
O segundo segmento dinâmico é concluído quando o veículo não consegue mais manter uma velocidade constante, terminando com a bateria completamente descarregada. O veículo permanece então inativo por duas horas antes de a bateria ser totalmente recarregada utilizando um carregador AC. Devido à perda de energia durante a conversão da corrente alternada da rede elétrica para corrente contínua armazenada, há uma variação na energia utilizada pelo veículo nos dois ciclos WLTC e na eletricidade necessária para recarregar completamente a bateria.
Todos esses dados são então analisados para determinar a autonomia oficial do veículo segundo o ciclo WLTP e o consumo de energia.
Embora o programa WLTP forneça dados mais precisos para comparar um veículo com outro, estes são apenas uma orientação, pois existem muitas outras variáveis que determinam a distância que um veículo elétrico pode percorrer antes de precisar ser recarregado .
Para começar, comportamento do motorista ao dirigir será um fator importante. Os veículos elétricos são mais eficientes na cidade do que em viagens rodoviárias, porque você pode aproveitar a frenagem regenerativa com mais frequência em trânsito intenso. E aproveitar a impressionante capacidade de aceleração de um veículo elétrico obviamente consumirá mais energia do que arrancar suavemente.
Além disso, dirigir com os vidros abertos e com rack no teto (mesmo não carregado) aumentará o arrasto aerodinâmico, reduzindo a autonomia, assim como a baixa pressão dos pneus. A utilização de sistemas auxiliares, como o ar condicionado e o sistema de som, também consumirá eletricidade extra.
Por fim, a topografia e as condições da estrada também terão impacto na autonomia, assim como o ambiente, com mudanças no vento, na chuva e na temperatura, que afetam a eficiência.

